Rio de Janeiro-RJ: Ocupa Mendes faz coletiva de imprensa para rebater acusações de juíza
Nesta segunda-feira a juíza Neusa Regina L. A. Leite da 14ª vara da fazenda pública emitiu uma ação de reintegração de posse do Colégio Estadual Mendes de Moraes ocupado pelos estudantes desde o dia 21 de março. O #ocupaMendes foi o primeiro colégio ocupado no estado do Rio de Janeiro e atualmente já são quase 30 colégios ocupados.
Segundo a juíza a ocupação impede o direito à educação pública pois os alunos e professores não grevistas estariam sendo impedidos de entrar. No entanto, os estudantes do Mendes de Moraes afirmam que alunos e professores não estão sendo impedidos de entrar no colégio para qualquer aula e que a ocupação ocorreu justamente porque a escola não estava podendo cumprir seu dever na educação pública:
“Nenhum aluno da unidade escolar foi impedido de entrar, muito menos professores, sejam eles grevistas ou não. O que acontece é que alguns professores não grevistas, por cederem à certa pressão do próprio diretor, acabaram se sentindo intimidados a ingressar na unidade escolar.” *
A Juíza também argumentou que os alunos estariam em risco por estarem no colégio dormindo e cozinhando sem a supervisão do estado. Os alunos rebateram afirmando que a maioria dos alunos ocupantes têm em média entre 17 e 19 anos, e que dormem e cozinham não só na escola, mas também em suas casas. Além disso, frequentemente pais e professores estão no colégio apoiando a ocupação, ajudando, comendo e dormindo na escola.
“[…] e não só na nossa escola: nas nossas casas nós limpamos banheiros, fazemos comida, cuidamos de irmãos, de primos, somos independentes. A maioria dos estudantes que estão aqui estão na faixa etária de 17 à 19 anos […] nós sabemos pensar sozinhos, nós sabemos fazer sozinhos.” *
Uma outra argumentação é a de que o imóvel não estaria cumprindo com a sua finalidade de servir à educação. No entanto, os itens das pautas dos estudantes, não apenas do Mendes de Moraes mas de todas as ocupações, denunciam a precarização das escolas e do sistema educativo, sendo inclusive, este um dos motivos das ocupações, reivindicando melhorias na condição de ensino.
“Nós não ocupamos a escola porque a escola estava com a grade de professores cheia. Ocupamos a escola porque […] turmas inteiras não estavam tendo aulas […] os reais prejudicados eram os alunos por causa do secretário de educação que não suspendeu o calendário letivo vendo que a greve dos profissionais da educação alcançou 80%. Ele nos prejudicou e não a ocupação.” *
Também rebateram à Secretaria de Educação que fez um apelo aos pais para que peçam aos seus filhos para acabarem com as ocupações. Os estudantes argumentaram que os seus pais apoiam e ajudam nas ocupações.
“essa luta, essa ocupação, não são apenas dos estudantes, ela é dos pais, da vizinhança, assim como a escola é nossa: do aluno, do professor, da vizinhança [...]” *
A secretaria, assim como a juíza e a imprensa, também os acusaram de invasores, além de outras acusações, como de ofensas e agressões não comprovadas.
“quero dizer que nenhum aluno ou professor foi agredido e que nós, estudantes, não invadimos o que é nosso. […] Também não houve impedimento do direito do outro, no caso daqueles que querem assistir aulas, porque as aulas já estavam sendo prejudicadas por causa dessa ampla greve dos profissionais de educação.” *
Os estudantes ainda invocaram a lei 9.394/96 art. 14
“que fala sobre a gestão democrática da escola, que antes não havia com nosso diretor amplamente opressor.” *
Os alunos afirmaram também que estão fazendo negociações diretamente com o Secretario de Educação, e que
“quando ele diz que não está havendo uma negociação ele está sendo mentiroso. No dia 29 de março houve uma reunião pessoalmente com ele e seu advogado no gabinete [...]” *
Concluíram que agora existem dezenas de escolas ocupadas e que as negociações não podem mais ser entre a escola e o estado, mas entre uma unificação das escolas e a Secretaria de Educação:
“nosso assunto não é mais Mendes e Secretario de Educação, mas 25 escolas que gritam pela demanda da educação.” *
Os estudantes das ocupações estão se organizando de forma democrática e através de comissões que dividem as atividades. Há comissão específica para cuidar da alimentação. Segundo alunos, pais e professores, a ocupação tem oferecido uma qualidade muito superior na merenda, promovendo muito mais variedade no cardápio e uma comida mais balanceada. Estudantes universitários de nutrição têm contribuindo nesse sentido.
Alunos afirmam que uma das pautas de reivindicações é a falta de funcionários da escola para cuidar da segurança e controlar os que entram e saem. Com a ocupação, a escola possui uma comissão responsável pela segurança da escola, controlando a entrada de todas as pessoas, e impedindo que estranhos e pessoas não identificadas entrem.
Entre as pessoas permitidas de entrar na escola estão todos os alunos, professores e apoiadores autorizados. Para que alunos possam entrar, eles devem estar identificados como estudantes do colégio, pois, segundo os alunos ocupantes, são muitos alunos e eles não são capazes de reconhecer a todos de memória.
Sabendo dessa regra de segurança, alunos contrários a ocupação, se aproveitam dessa limitação e forçam a entrada sem estarem identificados e invocam que estão sendo impedidos de entrarem no colégio.
Nesta segunda, durante a coletiva de imprensa, isso ocorreu mais uma vez. Para evitarem conflitos, os estudantes ocupantes decidiram por liberarem a entrada dos contrários à ocupação que estavam sem identificação, uma vez que se tratavam de poucos estudantes contra a ocupação presentes e que já eram conhecidos por todos. Segundo os estudantes, a regra de identificação já era praticada pela administração regular do colégio.
As ocupações estudantis vêm sofrendo com a forte oposição de seus diretores, órgãos do estado e da mídia corporativa em geral. O #ocupaMENDES, como foi a primeira ocupação, é uma das que mais sofre com tentativas de deslegitimação por parte destes. Nesta coletiva, estiveram presentes, entre outras, a rede Record e Globo que estavam claramente se opondo à ocupação.
Jornalistas de ambas as emissoras conversaram informalmente e entrevistaram apenas os poucos estudantes contrários à ocupação. No início da coletiva, os ocupantes acordaram que primeiro eles apresentariam seus esclarecimentos sobre as afirmações da juíza e as acusações da Secretaria de Educação. Em seguida abririam para perguntas, limitada ao número de três para cada jornalista. Uma jornalista da rede Record quis fazer perguntas além do limite acordado e como foi limitada pela mesa, foi embora antes do término. Pouco depois, a rede globo também foi embora antes do término.
“eu digo à toda mídia que vocês não deveriam estar aqui por causa da reintegração de posse, mas por conta desses livros que vocês veem abandonados e lacrados. Por causa da precariedade que a nossa escola enfrenta […]. *
“Ocupar, resistir. Lutar para garantir!”
* citações retiradas das falas dos estudantes do ocupa Mendes na coletiva de imprensa, conforme vídeo acima.